segunda-feira, 8 de junho de 2015

Hoje, sou saudade


Saudade de andar no tempo, sem me preocupar com ele.
Saudade de não ter saudade.
Saudade de correr feito louco na chuva, com pés molhados no barro macio.
Saudade daqueles amigos que partiram, ficaram e que eu parti.
Saudade de andar no silêncio das ruas da pequena cidade, simplesmente com medo de cachorros.
Saudade de não sentir medo e o único medo era algum dia ter medo de algo.

Hoje, sou saudade.
Sou sol-dade.
Soldado que luta uma luta vã contra a saudade.
Sou só...
Saudade.
Saudade dos rostos íntimos de quem dividia tudo: até as brigas.
Saudade de ter o dia inteiro para pensar no que pensar.
Saudade de chegar ao fim do dia e não ter pensado em nada.
Saudade do que um dia estaria por vir e veio e foi-se.
Saudade daquela escola que era um tubarão.
Hoje, sou saudade da cidade que era um vale, no paraíso.

Hoje, sou sal-dade da vontade de ir à cidade.
Saudade de pegar a bicicleta e fazer molecagem.
Saudade de ouvir novamente vozes conhecidas.
Sou soldado que luta contra a voracidade, dessas tantas
saudades, que hoje, sou saudade.

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Rosa de Jericó


Sou o espinheiro que galanteia as cercas
do terreiro,
A doçura do jiló que aborrece
as linhas de tua face,

Sou a rosa que é de uma vida só
desertando a vastidão,
a secura de Jericó,

cada um dos espinhos
que afasta insetos
e passarinhos,
mas chama a água,

Sou a areia farta,
a mistura fina
o toque suave
na visão vasta,

o forasteiro que para,
olha e contempla,
A nuvem chegante
para aliviar o viajante,

Sou sobrevivente, um pedregulho incandescente
andante contente,
nestas areias
em busca da próxima nascente,

a noite clara e fria,
seguidor adiante,
céu rachado
a tempestade,

Sou o raio lançado
o galho retorcido pelas mazelas
o tempo parindo melado,
enchendo de sopro
tuas costelas.

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Amém


Fortifica-se
te
me!

sábado, 31 de janeiro de 2015

Era tudo

Almoço coletivo, preparado por camponesas no sul do Piauí

tão gostoso, que
dava vontade de
abraçar
cada sabor,
cada gosto,
cada cor
terrosa.
Porque a vida é saborosa!


Uns teorizam. Outros experienciam

Casa camponesa, povoado do antigo Lameirão-PI

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Brevidade



Atenta,
fico a olhar
minha própria velhice.
Seria fácil se eu mesma
desistisse.

Curiosa,
fito a esperar
a velha e segura crendice.
O fim é uma lesma,
rastejando até chegar.

Serena,
finco as marcas
de minha própria arma.
Seria tola me apressar,
até a margem passar.

Rude,
sou poetisa ávida
e a vida
e a velhice
é tudo uma
dádiva.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

A solidão


Não era fria, nem monótona. Abraçava-me com uma fervura tamanha, de arrepiar qualquer outra presença. Um encontro possessivo e ciumento e, aos poucos, quando percebeu, já havia espaço para os poros.
Tudo estava inundado de um calor gélido e ultrajante.
Florescia ao entardecer, adentrando, amorosamente, as entranhas mais íntimas e profundas e...
amavam-se! Amantes conjugados em primeira pessoa.
No singular.
Preparava os rituais diários para a reza cotidiana.
Jamais esquecera, em toda sua vida,
de desejar-lhe bom dia ou boa noite.
Frequentava os mesmos espaços de si que o outro,
mantendo a quentura de uma não-presença
suficientemente forte
para evaporar o sol.
Era feito pimenta no olho: ardia como fogo.
Era feito pimenta no prato: realçava o sabor.

domingo, 23 de março de 2014

Sapato? Que sapato?


-Sim. Quem é?
(...)
Não, queridinho, estou ocupada!
Trabalhei o dia todo, na sexta-feira
ainda lavei casa e deixei a roupa
toda passada.

Saí à meia noite
e tomei todas.
Beijei um sapo
e ainda comi bacon
ao sair da balada.

Ah, meu caro!
Quero mais é ficar
chapada,
deitar de boa
no sofá e
ver a tevê.

Não sou dessas!
Meu pé eu não perdi,
eu só queria te confundir
após aquele beijo
sem sal.
Foi assim... muito normal.

Na minha comida eu uso
é muito tempero!
Gosto de cheiro verde
e com alho me lambuzo.

Esse sapatinho não é meu!
Nem queira me aborrecer
bebê...
Não quero um príncipe,
quero ser feliz do meu jeito,
de verdade.
Não venha sequestrar
minha liberdade!

Imagem aqui


quinta-feira, 13 de março de 2014

Eu [não] amei


Era primavera na minha noite quando deixei de amar.
Amei tanto que fui definhando feito orvalho ao ar.
E não queria mais,
mas também não queria pouco.

Assisti, de longe, o drapeado do nosso caso.
E, ao fim, amei minguante,
mais que um punhado
de arroz com marinheiro.

Não eram do mar.
Escorria pelo céu...
da boca.

E era ainda outono
a última vez que lavei-me.
Queria assegurar a permanência
de existir ao léu.

Deixei, naquela noite de primavera
o ar e as ondas que plainam a
asa da gaivota.

Não molhei com outra água a minha boca.
A saliva de teu beijo me basta.
O teu beijo povoa,
desde ontem,
a minha garganta seca.

Amanhã... Amanhã já não sei
se sede ainda terei.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Palavra mirrada



Há muitas eras, sou assim, um espinho fino entre os galhos que acolhem as pétalas. Não, não foi por natureza, foi de safadeza, como diria minha avó. Cresci pouco e mirrado. Tanto é que meus olhos ao invés de esbugalhados ficaram encalhados dentro da órbita sem forças para fazer a rotação sol afora.

Foi assim que, com minhas poucas polegadas, aprendi a lamber a grama seca, em que era jogado. Não lamentava, pois foi de lá, de baixo, que aprendi a olhar pra cima e ver as estrelas que começavam a dançar no salão azul, numa discreta competição para mostrar os trançados dos vestidos.

De longe eu passei a ser crente, tinha fé que ela não existia. Só me apegava a rogar quando ia anoitecendo e o milharal de vovô começa a se mexer e em poucos segundos estava, cada um, dançando sincronizado me atraindo para um mundo que eu ainda não estava pronto. Ah, mas quando o dia amanhecia, eu me vestia de diabinho e ia lá, enquanto os inimigos dormiam, eu empunhava a espada e cortava, mexa a mexa, todas as suas delicadezas. Até hoje não sei se era uma vingança minha ou dele.

E assim nasci um papel amarelado e pálido, sem muitas linhas para escrever. Foi por isso que, hoje, as palavras ainda não gostam de mim. A única forma que restou foi uma delas dizer: "Se nasci papel, quero morrer poesia." Ponto, correu, morreu.


domingo, 19 de janeiro de 2014

Alumeia o beco

Ô meu santo, que gira com os pés no chão batido
de tantos tambores
e outros tantos amores,
as mocinhas de coração
sofrido
e as mães de leite
derrabado

Ô meu vaga-lume seresteiro
que vagueia nos
terreiros
anuncia a lua cheia

Um benzimento
contra quebranto
e uns ramos de arruda
porque nessa vida sofrida
toda santa é a ajuda

Ô meu lampião
guia eu e meus santos
e se cansar
que haja muito barranco
porque nem todo santo
é branco
e ainda bem
senão
eu não via o que é bom

Ô dona dos becos
não deixe
que meus lábios
fiquem secos
se não tiver água
que seja ao menos um peixe
num cardume
de beijos.

Foto: Jossier Boleão

sábado, 18 de janeiro de 2014

Ao céu

Nesse céu, há terra e há folhas secas que caem
Mas também há flores que se camuflam nas cores
Dores sim, amores também
e uma certeza de
futuros que virão
feito os filhos,
o sol e seu clarão.

Na foto: Acauã, Tiê e Iara


A pimentada


Em certas manhãs, desenvolvemos as tarefas oculares necessárias:
- Olhar, olhando, olhado [bem ou mau]!

São tonalidades semi-separadas que vão entrelaçando
tramas,
gastando dramas,
falando das damas.

Em certas manhãs, não queremos nada a não ser:
- Manhar, manha, manhado [de ressaca ou de amor]!

São teias bordadas na ardura
da teoria empreitada,
cavada,
ardida feito
a paixão não-passada!

Foto: Jossier Boleão


quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Con-tradição


Sou inteiro e sou metade.
Metade de uma inteireza,
inteiro por ser metade.

Metade de mim é inteira,
outra metade é só a metade.
Um que é dois,
dois que é um.

Parte de mim é humano,
a outra, ainda há
salvação.

Sigo lento e curvo,
até mesmo na parte
menos escuro
sou metade
de um (in)seguro.

Minha metade
é amor,
a inteireza
é só água
desembocando em chuva.

Algo em mim é tradição,
minha vida é
contradição.

Há muito em mim
de tudo
um pouco
que não é muito,
mas que é transbordante.

Em mim,
há metades,
inteiros e condições.
Só não há limites
nem medições.

domingo, 20 de outubro de 2013

Arma-rio


Vira e revira
Viva-se e reviva-te.
Ossos postos,
olhos de corvos
mata acima,
rio adentro.

Chora-me e chova-te
choca os ovos.
Joga aos porcos,
cava terra
terra abaixo.

Asa de condor,
com dor
e quebrada.
Alça voo
e vou.

Arma-se, ama-lhe
rama-lhe-te
espinhos curvos
em caminhos
turvos.

Rio quando vejo,
rio quando choro,
rio pro rio
rio ao rio:
um mar(rio).


domingo, 8 de setembro de 2013

Epitáfio dos vivos

No dia anterior à morte, todos os sinos estavam em silêncio.
A vida continuava no seu curso normal, serpenteando por becos e ruas. Se alastrava entre os bares e jorrava sorrisos úmidos, no meio da multidão, em minha memória.

Eu, nem ria, nem chorava. Era uma reação de não reagir. Não tinha mais o mínimo desejo de interagir com as folhas, o sol, as flores ou as borboletas. Estava num cansaço terrível pela transitória passagem do pouco para o nada.

Ainda confundia-me com os poucos chamamentos, profundos e quietos, que uns poucos faziam. Dentre eles, escutava as vozes conhecidas de quem, de alguma forma, tentava acordar-me pela memória ou pelo arrependimento.

De antes, uma verdade eu levara: não há arrependimentos vivos na morte. O arrependimento está em quem continua anterior a esta condição de silêncio, de quietude e imutação, que por vezes, chega a ser perturbadora.

Quando permitido, caminho sem saber as horas ou sem preocupar-me mais com elas, já que não preciso ir ou chegar a lugar algum, e vejo lápides...muitas lápides!

Em cada uma há uma mensagem escrita. Para uns todo o amor eterno, que já tem a data de fim marcada. Em outras, longos textos que rementem ao simples desejo de ter dado um "oi", "tchau", "até logo, meu amigo"...

Curiosamente, não vejo o mesmo feito por outros mortos. Todas estas lápides são dos vivos que conheci e que, por algum motivo banal deixaram de dizer a mim, enquanto eu podia olhar nos olhos ou dar um longo abraço... Vendo essas letras que escorrem água benta delas, lembrei-me de longos abraços que tive com alguns amigos, das danças e das risadas e das lágrimas...até ter esgotado tudo e uns irem antes de mim.

Nessas minhas lembranças, visualizo fracamente o rosto de alguns, mas o arrependimento é tanto que desfigura e vai, aos poucos, sumindo feito fumaça. Se eu pudesse falar para eles me ouvirem, diria para não perderem tempo enquanto podem ser escutados e sentidos. Nem deixar de escutar e sentir.


domingo, 1 de setembro de 2013

A morada


Vazia.
Acolhida pela aurora que atormentava o sereno pálido, mas reluzente no gramado verde-musgo, acrescentado por pequenos pontos amarelos, de textura aveludado-suave.

Encolhida.
Janelas torneadas por uma borda vermelha, contrastando com as paredes verde-cana. Porém, escondida no meio do lilás de Santa Bárbara, para proteger dos raios, relâmpagos e trovões. Só não protegeu da amargura do esquecimento.

Distante.
Acariciava o luar, vendo o silêncio falar vozes na cabeça e murmurar atordoadas estórias de um tempo muito longínquo, em até os bichos falam a nossa língua.

Fora.
Em mim, morava essa morada vazia de paredes feitas de madeira maciça, com todas as frestas amparadas por arredondadas ripas. Imitavam um auto-relevo, igual à barra da saia da velha que debulhava em forma de godê, tantas vidas numa só.

Dentro.
A casa estava fora de mim e aqui já não existe mais o espaço preenchido pelo barulho coordenado das madrugadas com finos respingos de uma chuva delicada e macia.
Eram tempos de morar fora e dentro de nós. Era uma moradia de memórias...hoje, todas, tardias.


quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Verme-lho


Ah, esse meu verme
é bordô
parece tricô
e transborda
a epiderme.

Vermelhou
ver-me-lhá
do fundo
à borda.

Tira minha
carne,
rasga o sangue
tinge a linha.

Ver-melhando
a tecitura
compondo
imagens na rasgadura.

Ah, esse meu verme
lho trago num trago
prato raso
o som de outra
partitura.

Ver
Me
Lho
o verme
habitante
cortante
vermelho
eu,
pingante...


segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Atenta[mente]



Era domingo.
Era tarde.
Era início
de era.

Era ela,
à espera.

Atentamente
com toda
a mente.

Era domingo.
Era olhar
que não erra.

Admirável
mente
ausência
sente
nas plumas
da gente.

Solidão
demente
à espera
da nova era
do novo
amante.


domingo, 11 de agosto de 2013

Ex-crita

É assim uma boa receita de escrever:
a escrita.

Ingredientes? Sim, as palavras.

Há, quem diga: "Não é jogar as palavras soltas!"

Eu prefiro a liberdade. Por isso, minhas palavras
estão sempre soltas.

Vão para onde desejam, da forma como querem.

Nos melhores conselhos diz-se que precisa ler para escrever.

Eu curto a ideia de escrever para ler.
É um ato íntimo entre mim e minhas palavras.

Palavra é igual a vida: única, íntima!
Não há receita, há ação...para ambas: escrever e viver.

domingo, 21 de julho de 2013

Auto-retrato


É raro e caro.
Acompanha as estações:
em alta ou não!

É auto e de si
É fora e ... também.

É auto-retrato.
Auto-postagem.
Auto-viagem.
Auto-flagelo?

É auto-susto,
alto custo.
É espelho móvel,
fixo sorriso.

É auto-sorriso.
sorriso falso.
Auto-olhar
de si
fora de si.

Retrato virtual
Rosto sorridente banal
Auto-curtida
de uma carência enrustida.


segunda-feira, 24 de junho de 2013

Uma lua cheia...


De memórias. Sim, toda vez que avisto preenchendo o espaço perplexo por tanta imensidão de céu, a lua cheia, encho-me de uma chuva do tempo de outrora.

Parece somente lembranças de uma criança perdida, que ficou adulta antes do entardecer. Mas não. É o luar que arregaça as mangas e entorna baldes de cheiros, orvalhos, olhares distantes ao infinito tão finito.

Lembro-me sempre que a lua está quase preenchendo todo o meu céu das vezes que eu, deitado na grama do quintal rural, ficava à espreita tentando presenciar o mínimo que fosse movimento das estrelas.

Eram horas a fio e quando acontecia parecia mais como se eu fosse capaz de quebrar o silêncio estelar com meus próprios desejos. Ou talvez, era aquela gigante dizendo às estrelas que precisava de mais espaço para brilhar sobre mim!

Ao embalo da lua cheia, vinham as estórias contadas pelo avô ou pela avó: ele gostava de contar aquelas fantásticas, com seres imaginários, lugares desconhecidos e bichos que falavam.

Ela contava sobre o que lhe havia acontecido no tempo de mocinha, com os pais e os avós dos avós: coisas de assombração. Mas tudo real!

Nesse tornel de gostosuras noturnas, de uma vida pacata, a lua cheia preenchia todo o meu universo e ainda tinha a despretensão de salpicar pequeninas gotas de sereno, que dava um aroma gostoso de chuva. Porém, era uma chuva tão silenciosa que deixavam brancas as pontas dos capins e mantinha a ópera dos grilos festeiros.

Eram assim nas noites de lua cheia: o céu repleto e eu completo, feito o pote de paçoca pisada no pilão, bem guardado no armário da cozinha.


quarta-feira, 15 de maio de 2013

(Descon)Trair


Conjugo esse verbo em primeira pessoa.
Não que isso de forma vã soa,
mas que ao ânimo me povoa.

Tudo que era criança inventiva,
tornei-me pessoa adulta descrente
ao ponto de ter uma índole descente.

Contudo e todavia,
inventei minha própria
via.
Porque eu nunca gostei do que via.

Portanto e entretanto,
contraio a língua semi-nua
e atravesso a carne crua,
espelho da própria sorte,

a morte.

Flexiono de cabo a rabo,
o presente e o passado,
só pra deixar o ex-amor
calado.

com cara de retardado.

Compro minhas próprias sentenças
invento tantas lembranças
e me traio,

com palavras e ações,
mais um mar de intenções.
 

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Descobrimento dos Trinta


Descobrir-se aos trinta é quase uma sensação de estar no meio de uma encruzilhada. Nem andou muito, nem andou pouco. Não é jovem, mas também não é velho. Não pode avançar os semáforos, muito menos recuar.

É uma sensação, aos trinta anos, de estar no meio vindo de algum lugar indo para não sei onde. Não que qualquer caminho valha à pena, mas que ainda há as incertezas e os medos da velha infância. Não se pode esticar demais porque o cobertor ainda é aquele usado no final da adolescência, no entanto, uma posição fetal já não condiz com o que quer que você queira e queiram de você.

As estranhezas de se fazer trinta aumentam, quando pensa que nasceu no mês cinco, nem no um, nem no doze e muito menos no seis. Tinha que ser no mês cinco, um quase meio, nem pra frente, nem para trás. Também é questionável, quando se nasce no dia dezoito, pouco depois do meio, mas não muito adiante. E quando você faz as contas e descobre que nasceu às 12h20 em plena quarta-feira?!

Isso lá são horas de nascer? Talvez, seja por isso que meu dia só começa após o meio-dia. Antes disso, não estou nascido para nada, nem para tomar café!

Quarta-feira, sempre foi meu dia preferido já não é mais o início da semana, mas também não é o fim. E nesse meio, há sempre a ilusão de conseguir concluir tudo o que se iniciou após o meio-dia.

Sempre achei que aos trinta eu deveria ter concluído tudo o que queria, porque acabaria alí. Não sei, pode ser que até termine, mas como nasci de meio-dia para tarde, também posso pensar em fazer outras coisas após as 12h20. Particularmente, acho números bonitos.

Enquanto a maioria nascia de madrugada, na madrugada eu já estava pronto para curtir a noite e já tinha visto o primeiro pôr-do-sol. Talvez, seja também por isso que minha cabeça chegou lá, depois do meio, antes do meu corpo. E que seja assim...porque taurino gosta do descompasso, do faz-de-conta: quando pensam que está furioso, não está; quando acham que está manso, abaixa a cabeça, joga vento pelas ventas e parte pra cima.

Coincidetemente, aprendi bem antes dos trinta a observar o comportamento dos touros e sempre achei calmos demais, mas que não apareça murundu no meio do caminho...é cabeçada pra todo lado.

Aos trinta, a gente começa a aprender a ser intolerante com a intolerância. A engolir menos seco e a acordar mais cedo [eu, continuo acordando tarde]. Descobrir-se com trinta é como acordar ao meio-dia: descansou mais pela manhã e tem energia a mais pela tarde.

E assim vem os trinta, nem no início, nem no fim. No meio.

sábado, 4 de maio de 2013

Nos tempos do igual...


É fato que vivemos nos tempos do igual, porém isso está longe de ser [ainda] tempos de igualdade.

Os humanos caminham, no seu processo (des)evolutivo como se estivem adentrando numa grande massa e no fim se tornar um único exemplar.

Você sai de casa e está tudo padronizado. Todas as pessoas têm o mesmo corte de cabelo, a mesma cor, as roupas são as mesmas, a altura é igual...até o comportamento é o mesmo: a predileção pela violência.

E agora, quando a fantasia tomou conta da realidade, temos câmeras espalhadas por todos os cantos, monitorando nossos passos. No entanto, parece que se torna um novo fetiche para o crime. O desejo de exposição está além dos artistas que vemos na TV, nos palcos, nos shows. Agora, todos nós podemos ser artistas...

Comete-se assalto e é filmado. Agride-se a esposa, a namorada, a criança, o cachorro e lá está a película. Atira-se à queima-roupa no outro por sete reais, um celular, poe fogo em outra pessoa por ter trinta reais. Definitivamente não há predador mais cruel que o humano.

Aliás, espero que a etimologia de humano, da forma que conhecemos hoje, seja daqui um tempo estudada na história da língua, porque seu significado já é obsoleto frente à tanta crueldade.

Talvez, seja essa necessidade de estar igual que desencadeia o desejo de ser diferente e culmina na rebeldia desprovida de "humanidade".

É nesse tempo de iguais, tudo está [quase] comum demais!