quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Entre frestas, olhares e outros vôos


Mas olhe bem. Nem mais nem menos, a duas polegadas abaixo.
A dois dedos acima da marca, que marca.
E finda.
A fenda e
tira a venda.
Põe à venda!
Depois um mantra para voar
ou talvez esquecer de olhar.
Não querida! Não sou Fri[d]a
Nem Mona-lisa.
Sou calo,
e sou baralho.
Uma carta marcada
de pintura sensível,
de pele tingida
de amor e desejos...coisas de fera ferida.
Mas olhe bem, meu bem.
Porque é só hoje que você me tem.
Mesmo que eu faça de mim um mosaico,
amor prosaico.
Porém, lanço-me entre as gaivotas
nos olhares de tantas Fridas e outras Monalisas.
E acabo indo e voltando igual à brisa.


Foto/modelo: Tati Almeida

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Palha Seca



Percorro a terceira faixa final, ao som da música, que era para ser matinal.
Tentativas? Sim. Todas, pois como diz a música, o amor pode ser a morte da esperança.
...Nada demais.
Só capim seco, folhagem tostada que alimenta o gado, à beira da estrada.
Sem dissoluções, nem conclusões dessa multidão invisível anexada ao estômago e sintetizada por um sorriso, à sua espera.
Nada de janelas, nem de corredores vicinais. Só chão!
Espere! [...] Tudo é um surto para acalentar a ânsia do sol quente na moleira...
Quanta besteira penso quando vejo a flor de ipê parecida com a de paineira.

domingo, 26 de agosto de 2012

Duas colheres de mim e meia pitada de você


Depois de um tempo não há leituras necessárias. Nem mesmo programas a serem feitos. Quase tudo já está concluído. Menos aquilo, que precisa de uma receita antiga com novos ingredientes.

Não sou bom em expressar pausadamente  o que sinto. Nem curto a ideia de precisar pontuar os fatos, de fato. Sou péssimo em palavras e ações, mas certeiro em emoções. 

Acordei e achei que precisasse de algo extraordinário para levantar da cama, abrir a janela e atender os Testemunhas de Jeová. Mas não. Antes, eu só precisava achar a sua marca: firme, rochosa e gasosa.

Nada. Tudo bobagem. Todos os preparos dominicais que minha avó faziam, hoje tem um sentido, porque todos são ritos e citam, categoricamente, um dia diferente, com mesmos sentimentos.

E quando eu penso em você, vem à cabeça um grande romance, desses que podiam até ser novelados, no entanto, falta articulação das ideias. O coração não corresponde aos dedos digitadores e o cérebro se cansa com toda a sacanagem.

Sacanagem. É o que vamos nos provocando. Sabotagem. É o que estamos prestes a cometer, antes do suicídio ordinário. Ou extraordinário?! 

Somente em proclamar a palavra VOCÊ já me sinto suicidando. E é o suficiente para uma manhã de domingo.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Desaguando


Ouço atentamente cada palavra que sussurra em meu estômago. Sim, elas não estão em meus ouvidos (também), estão é no estômago, bem naquele lugar que a gente sente aquele friozinho, aquele vazio, aquela alegria, aquela algazarra desvairada de estar ansioso, contente, amante.

E vejo. Vejo poesias rindo da minha cara e até debochando porque eu tento pegá-las no brincar de pique-pega, mas são danadas! Correm igual meus sorrisos.

Sinto, silenciosamente, umas outras sensações novas que não consigo entender o nome delas, porque falam tão baixinho e ficam espremidinhas num canto, como quem está com muito frio, segurando com as pequeninas mãos, os joelhos e falando em voz tênue as suas vontades.

Calo e deixo todas à vontade para brincar pelo quintal e observo atento o quanto de vida há aqui dentro. É como se acontecesse uma procissão, em que os adultos vão rezando e segurando as velas, juntamente com seus terços encardidos de tanto passar pelos dedos e a molecada fazendo a festa, nas noites enluaradas.

Há momentos que me canso de ver tanto movimento. Mas é bom! Assim os dias em mim passam mais rápidos e me aproximo mais de encontrar. Encontrar o quê? Quem? Onde? Não sei. Mas vejo essa multidão de pequeninos e pequeninas que estão me atiçando e me impulsionando para frente.

Lentamente. Vagarosamente. Deixo anoitecer para cobiçar as estrelas e perceber a coreografia dos vaga-lumes que desaguam o mundo na noite em pequenos pontos de luz. Seria até poesia, se não fosse verdade essa emancipação da teimosia que se reparte e partilham entre si e comigo as sutilezas mais nobres.

E aí penso: ainda viro vaga-lume e vou desaguando a eternidade nesses lugares escuros.

imagem


sábado, 18 de agosto de 2012

A sede




Tantos desejos, tantos erros, tantos acertos.
Tantos tantos
Que faltam tantos.
Só não se esqueça dos poucos,
Dos mínimos, dos mimos e
Dos meninos.
Tantos sonhos, tantos planos, tantos panos.
Tantos danos
Que faltam humanos.
Só não se esqueça que para tudo mudamos.
Um gole de água fresca,
Um bom dia na manhã da seca
Um romper de cerca.
Só não se esqueça de cada cor.
A vida pequena levada pelo condor
O néctar do pólen no bico do beija-flor.
Só não se esqueça do amor, nem da dor.
E é tanta sede nesse mundo,
É tanto querer sem fundo
E é tanto perder
É tanto anjo-defunto.
Vivemos em um mundo com sede
Que não tem sede.
Só não se esqueça das preces.
Dos dias e das noites.
Das mortes e das vidas.
Das idas e das vindas.
Só não se esqueça,
Que em um dia qualquer, tudo desapareça.


Tal Pretume


Devora-me ser estranho,
arranque minhas entranhas
faça as tuas caras estranhas.

Me engane, corrompa a língua
injeta teu sexo no meu perfume
e adeus aos bons costumes.

Concorra-me no bingo,
rasgue minhas roupas na tarde de domingo
coma-me igual ao prato findo.

Cante baixinho uma melodia,
toque meu corpo todo dia
e até logo à minha solitária orgia.

Venha, engasgue-se na minha porta,
deixa o amor para a próxima
e fique até amanhecer

Banhe-se em mim
cuspa teu desejo em outras línguas e latim
e goze até não ter mais fim.

domingo, 12 de agosto de 2012

Crônica da última noite com você


Achei que não, mas era mentira. Apesar de toda a ausência ainda há toda a sua presença. Como se fosse um presente raro e bobo, que a gente não joga fora por achar fofinho demais.

Percorri aquelas mesmas calçadas que a gente. Vi as mesmas lojinhas entalhadas em fechaduras que antes admiramos feito criança. Sentei, por alguns segundos, naquele banco de madeira, naquele mesmo restaurante com vista para o riacho e para as pessoas se banhando nas geladas águas.

Não tomei a nossa bebida, mas comprei uma água, para acompanhar os meus olhos que se molhavam naquele instante, ao memorar a foto límpida, cravada em porcelana, com dizeres de amor eterno.

Você não estava lá para tirar aquela foto do impossível, nem da bonequinha de lata, mas eu fui lá e disse a ela que eu também sinto saudade. Cortejei as mesmas formigas, com menos admiração porque eu estava solitário demais.

Pirinópolis. Eu sei que tem muito de muitos, mas também sei que tem muito de mim lá...Por isso, não quis repetir as mesmas fotos, não quis macular os mesmos lugares nas mesmas lembranças.

Até olhei, para ver, se por acaso eu não encontrava você a metros de distância para fotografar seus passos. Não encontrei. Mas me vi, parado sorrindo com a alma o amor do passado, as juras fincadas sob a voz daquela cantora, na melodia perfeita daquelas músicas.

Voltei lá. Vi tudo diferente e até pensei que a cidadela toda havia mudado de lugar. Mas não. Naquela época, eu via tudo com os seus olhos e dessa vez, fui obrigado a ver com os meus próprios. 

Foi bonito, eu confesso. Foi alegre, eu acredito. Mas não foi completo. Porque completo mesmo o tempo apagou e há certas borrachas que apagam por definitivo, mesmo que ainda haja o contorno do que um dia existiu naquela folha.

Fiquei feliz sim, por ver novamente e dessa vez olhar toda a poesia e ter que deixar o amor calado. Ele, o amor, tem mania de dizer palavras impróprias em momentos perfeitos. Até mesmo ele se desgoverna, às vezes e todas as justificativas são poucas para o amor, porque amor é amor. Igual à última noite com você.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Velha

Sou uma velha.
Não temo, 
nem tenho.
A vergonha de dizer 
Nasci primeiro que você.
Sou uma velha.
Não corro,
nem morro,
também não posso.
A tolerância que não tens.
Durmo cedo,
Acordo cedo,
Tenho dores e sou uma velha
Nasci antes do sol
Criei o gosto e pari o desgosto
Por isso, vejo-me no direito
de cuidar dos ratos de esgoto.
Você, mocinho
Você, mocinha!
Não tenho vergonha
de abanar a anágua
de dizer que meu penico deságua.
Não tenho história,
tenho trajetória
Nada de glória,
nem de muito homem
Só no nome: Mara da Glória Osória.
Sou uma velha, dessas boas
e mesquinhas.
Odeio fazer rosquinhas
e jogo veneno para as rolinhas.
Sou uma velha de estrada
de vida cansada
de aparência usada.
Sou uma velha.
Velha sou,
que o tempo mesquinhou.
Sou uma velha de risada farta,
de mão pesada a tecer com a parca.
Risquei a pedra,
com enferrujada faca.
Voei, antes da era, numa vaca.
Não lhe devo satisfação,
Muito menos gosto de oração.
Há muito já morreu o velho coração
Engolido de um só vez
por um falcão.
Por isso minha rudez,
e minha pele no escuro
flácida de nudez.
Talvez para todo o sempre
ou uma única vez.     

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Dia de roceiro



Eu paro e penso naqueles dias. Dias tão rosados quanto o rosto do Sr. Dias. E Dona Maria Fia?
Ah, como ela dizia que em dias de lua cheia tudo rendia.
Meus olhos até hoje ficam parados percorrendo os cafezais.
Correndo entre os quintais e debulhando milharais.

Quanto cansaço! Era um trago e um maço
E meus tios até comiam macaco.
Eu preferia caçar passarinho no laço. 

Dias de enrolar na palha o tabaco.
E esquentar ao sol a cartucheira para ir ao mato.
Tocaia!
E havia a lua que espantava os medos
Até que os bichos escapavam entre os dedos.

Eu paro naqueles dias. Dias de peixe frito.
E minha avó?
Tecia uma carne de frango macia
Com massa para toda a família na bacia
E assim a vida ia.

Aquelas noites... arrumava-se uma grande vara de pescar
E rodopiava pelos olhos curiosos de vovô
Antes de dormir e acordar cedo.
Pescava-se um bando de morcego
Coitados!
Apenas ficavam atordoados.

Quando havia as fogueiras
E um punhado de molecada
O mundo perdia sua beira
E até os velhos era uma única brincadeira
E assim a vida era levada.

Comida levada na roça
Ao meio-dia para tirar a carga das costas
Comida fria
E sol quente
Igual ao feijão com muito alho de dente.

E assim iam os dias da gente...




domingo, 5 de agosto de 2012

Tua sede



Que seja essa a nossa melodia
e a cada dia mais
um ressoar
um mergulho no ar.


Que esteja a todo dia
e a cada momento mais
um pouso em outro cais.


A tua sede
que me embebeda 
nossos desejos enroscados
na suja parede.


Tua sede é meu desejo
é meu erro
é meu orgulho.


Tua sede é minha vingança,
um riso de criança
e teu medo rastejando em pedregulho.

sábado, 4 de agosto de 2012

O afago que eu T(e)rago



Vazio e cheio. Na mesma inconstância que  o rio
o perfeito silêncio
o absurdo cio
Eu inicio
sem rimas, sem finalizações e muito menos começos.
Quero pular os tropeços
adiantar os choros e os sete dias de terços.
Hoje te trago
Amanhã, você já não será meu mais gostoso trago
Porque é fraco
é de um tanto opaco.
Eu quero mais
quero a certeza de não correr 
a verdade de não esperar.
Venha a chuva macia
sacudir minhas águas desse rio que corre dentro da bacia.
Venha teu afago triste e sozinho como uma pomba em noite fria
galopar o ar
e aí, já não haverá rima
estou um degrau acima.
Voei de tanto esperar a água do moinho novamente chegar.